Porque há, sim, interesses econômicos por trás das manifestações - Pablo Villaça

Há uma dissonância de uma boa parte daqueles que foram às ruas nesse domingo e que podemos identificar nestes espaços pelos avatares que exibem apenas "Fora Dilma! E leve o PT junto!" e mensagens afins. Trata-se de uma direita raivosa, irracional, que responde a qualquer tentativa de argumentação com gritos e ofensas.

Em um de meus últimos posts aqui, por exemplo, apontei o óbvio: que as manifestações trouxeram indivíduos predominantemente brancos (e é sintomático que aqueles que tentaram provar o contrário usaram invariavelmente as mesmas duas ou três fotos). Assim, era razoável supor que as classes economicamente mais favorecidas dominaram o protesto - outra hipótese amplamente confirmada até mesmo por veículos da mídia que claramente torcem contra o governo.

A resposta imediata de muitos foi a mesma que praticamente todos os meus posts políticos geram (e até mesmo aqueles sobre Cinema, já que estes reacionários hidrofóbicos não perdem a oportunidade de xingar mesmo quando o tema discutido é outro): "Lixo humano!", "Seu merda!", "Canalha!", "Imbecil!", "MORRA, VERME!" e outras tantas variações sobre o mesmo tema.

Aqui e ali apareciam alguns tentando argumentar, mas eram poucos.

E aí vem a questão: esta proporção é a mesma encontrada nos perfis dos manifestantes? Honestamente, não sei dizer - mas espero que não. Ir para as ruas protestar contra a corrupção, por melhores condições de vida e mesmo contra o governo é algo que faz parte da democracia e, assim, seria desalentador constatar que a maioria queria apenas gritar "Impeachment!", "Fora Dilma!" e por aí afora.

O que me traz de volta à dissonância que mencionei no início: vira e mexe, alguém me acusa de pregar que somente a esquerda é virtuosa e que a direita só pensa em si mesma. O curioso é que estas mesmas pessoas não hesitam em entrar aqui para me acusar de "bandido", "cúmplice de ladrões", "safado" ou de "mamar nas tetas do governo", sendo aparentemente incapazes de acreditar que - vejam só que espanto! - também sou contra a corrupção. (E não, NUNCA recebi um centavo de qualquer partido, direta ou indiretamente, para defender o que quer que seja.)

Surge, então, o espanto: "COMO você pode defender este governo se não apóia a corrupção? Você é cego para os defeitos do governo???".

E a irônica verdade é que tenho MUITAS críticas a ele. Talvez mais do que os que foram à Paulista neste domingo, pois minhas críticas têm a ver com o fato de que Dilma deu várias indicações de que seu segundo mandato seria mais à esquerda do que o primeiro e, na realidade, migrou para a direita (e é por isso que não entendo por que os eleitores de Aécio estão achando ruim; ela chegou a nomear um ministro da Fazenda que estaria perfeitamente confortável numa gestão Aécio, além de adotar doutrinas econômicas que obviamente fariam parte da administração tucana). Assim, tenho razões de sobra para protestar contra Dilma.

NO ENTANTO (e isso é fundamental), não tenho motivo algum para pedir seu impeachment. Ela não foi acusada de crime algum - e muito menos com qualquer evidência. Não se tira um presidente simplesmente porque não gostamos de sua gestão. Dilma foi eleita com mais de 54 milhões de votos e, portanto, é muita presunção acreditar que o um milhão de pessoas que foram às ruas têm o poder de derrubá-la no grito (particularmente se considerarmos que a maioria daqueles que protestaram provavelmente votou em Aécio). Além disso, resumir a corrupção à Dilma ou ao PT é algo absolutamente irracional, já que convenientemente ignora a privataria tucana, a lista de Furnas, o trensalão de São Paulo, o aeroporto de Cláudio e - o mais óbvio - o fato de que os partidos que dominam a lista da Lava-Jato são o PP e o PMDB (e é inacreditável ler cartazes pedindo a EDUARDO CUNHA, listado por Janot, que "salve o Brasil" ao "tirar Dilma" do poder, já que ele e Calheiros, que entrariam diretamente na lista de sucessão, estão sendo investigados).

(Aqui faço parênteses obrigatórios para esclarecer o óbvio, mas que sempre é martelado nos comentários: eu não estou "justificando" atos de corrupção envolvendo o PT ao listar outros cometidos pelo PSDB, PMDB, PP, etc. Estou simplesmente apontando a hipocrisia daqueles que limitam a revolta a um partido como se todos os demais fossem puros e angelicais que apenas não conseguem salvar o Brasil por serem impedidos pelo maligno PT.)

Aliás, como falei no twitter, esse movimento golpista que vem surgindo é algo extremamente prejudicial à democracia como um todo - até mesmo por impedir que pessoas como eu, insatisfeitas com os rumos do governo, possam se manifestar criticamente, já que estamos na desconfortável (mas constitucionalmente correta) posição de sermos obrigados a defendê-lo contra golpismo.

Não que eu não tenha outros motivos para defender o governo Dilma, pois tenho - mesmo com todas as críticas que tenho a fazer, como a doutrina econômica adotada, um ministério que traz Kátia Abreu e Kassab, as concessões à bancada evangélica, o afastamento dos movimentos sociais e por aí afora.

Eu defendo este governo também por causa dos projetos sociais que desenvolveu e vem desenvolvendo.

Defendo este governo por ainda ter um viés de esquerda.

Defendo este governo pelo fato de o salário mínimo ter o maior poder de compra dos últimos 50 anos (fonte: http://exame.abril.com.br/…/salario-minimo-tem-maior-poder-…).

Defendo este governo por ter tirado 42 milhões de pessoas da miséria.

Defendo este governo por ter tirado o Brasil do mapa da fome da ONU (fonte: http://www.mds.gov.br/…/brasil-sai-do-mapa-da-fome-das-naco…).

Defendo este governo porque a inflação anual no governo Dilma ainda é MUITO menor, na média, do que a inflação nos períodos FHC e mesmo Lula (6,14 x 9,71 e 6,43).

Defendo este governo porque, apesar da imprensa pintar a Petrobrás como um desastre, ela acabou de se tornar a maior empresa petrolífera de capital aberto DO MUNDO (fonte:http://br.reuters.com/article/topNews/idBRKBN0KH23L20150108).

Defendo este governo porque, apesar de a imprensa pintar a Petrobrás como um desastre, ela acaba de bater recordes de produção (fonte:http://br.reuters.com/ar…/businessNews/idBRKBN0L72FH20150203).

Defendo este governo porque, apesar de a imprensa pintar a Petrobrás como um desastre, a produção de petróleo cresceu 20,3% em janeiro em comparação ao ano anterior (fonte: http://oglobo.globo.com/…/producao-de-petroleo-no-brasil-cr…).

Defendo este governo porque pela primeira vez a corrupção está sendo investigada em vez de varrida para debaixo do tapete - tanto que o país MELHOROU de posição no ranking internacional da corrupção (fonte:http://www.bbc.co.uk/…/141202_ranking_transparencia_interna…).

Defendo este governo porque o acesso de estudantes pobres à universidade pública cresceu 400% entre 2004 e 2013 (fonte IBGE:http://www.brasil.gov.br/…/acesso-de-estudantes-pobres-a-un…).

E defendo este governo, enfim, porque foi eleito democraticamente com 54 milhões de votos e não cresci numa família que carrega no corpo as marcas da tortura na ditadura apenas para ver, em 2015, um movimento direitista tentando derrubá-lo por interesses econômicos.

Porque há, sim, interesses econômicos por trás das manifestações. Não é à toa que a Globo passou semanas divulgando o protesto de ontem e decidiu tratá-lo como uma espécie de Carnaval, prometendo cobertura contínua nos dias que o antecederam e ignorando os cartazes mais racionais (como aqueles que pediam reforma política) e valorizando apenas o viés golpista dos que gritavam "Fora Dilma".

A mesma mídia cujos barões estão listados com contas no HSBC suíço, mas que, claro, esconde a questão do público.

Protestar contra os rumos da economia, contra a inflação, contra a corrupção e mesmo contra o governo é algo natural e democrático. O problema começa quando os que gritam se tornam irracionais e passam a acreditar que os volumes de seus berros lhes conferem o direito de determinar quem pode ou não governar o país.

E não creio que eu seja um "bandido", "safado", "lixo humano" ou "canalha" por apontar isso.

Pablo Villaça

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