Por que me confessar?

Antes pensava que ser pecador era uma coisa que eu fazia ou deixava de fazer. Se não matasse ninguém, estava tudo certo. Depois entendi que, mesmo que eu não matasse uma pessoa, mas a odiava em meu coração, estava pecando.

Hoje entendo que ser pecador tem mais a ver com uma condição. Uma distância em relação a Deus, que não sou capaz de eliminar, só com minhas próprias forças. Se você entende a distância que há entre um playmobil e um homem ou entre uma boneca de pano e uma mulher, você entendeu o que é ser pecador. Para ser discípulo é necessário eliminar essa distância a cada passo que se der.

Antes encarava o "arrependimento" como tristeza, um querer voltar atrás. Por causa disso, era do tipo que dizia: “só me arrependo daquilo que não faço, não do que faço”. No entanto, a palavra usada por Jesus para "arrependimento" na Bíblia foi "metanoia": "meta" = além, que vai além + "nous" = pensamento, mente. É a mesma palavra que traduz "conversão". Nesse sentido, arrepender-se significa pensar diferente, criar uma nova forma de compreensão do mundo. Hoje entendo que converter-se a Jesus tem muito mais a ver com uma nova forma de enxergar, pensar, viver e se relacionar do que com querer apagar um passado. É decidir viver de forma coerente com todo universo de possibilidades que existe quando assumimos fazer acontecer o Reino de Deus aqui e agora.

Para ser discípulo é necessário reconhecer nossos limites. Não para apagá-los, e sim para que eles não nos prendam e impeçam de sermos aquilo que humanamente somos. Daí alguém pode pensar: mas se é assim, por que preciso me confessar a um padre? Não é suficiente a minha oração a Deus?

A resposta é: sim e não. A experiência com Deus é pessoal, mas o discipulado de Jesus é comunitário.

Usemos, então, uma metáfora para tentar entender melhor: imagine que um jogador de futebol, craque do time, treina 4 vezes por semana, em dois períodos, com foco no jogo de domingo. Já na sexta, quando o técnico diminui a intensidade do treinamento, libera seus jogadores mais cedo para estarem com a família, antes da concentração no sábado. Esse craque, ainda solteiro, decide não descansar e ir aproveitar a noite. Resultado: chega à concentração sem ter dormido bem, nem ter se alimentado direito. O corpo dele está fora de sua condição ideal no dia do jogo. Já no segundo tempo, o cansaço se impõe e seu rendimento cai, comprometendo todo o time, que no fim do jogo, sai derrotado. O jogador chega ao vestiário e percebe a cara de decepção dos colegas e de seu técnico. A voz da consciência fala alto e ele, então, no uso da palavra, publicamente, pede perdão a todos. Assume seus erros e estabelece ali um compromisso de se dedicar mais, com mais afinco e com motivação renovada. Neste momento pouco importa se ele é o craque ou o mais inexperiente. Importa o grupo, o time, a coesão, a unidade, retomar os objetivos. O grupo acolhe o jogador arrependido e este se percebe mais uma vez integrado, comprometido.

Com a Igreja, no sacramento da Reconciliação, é assim que funciona. Por mais que nossa condição falha se dê no âmbito da intimidade, haverá conseqüências coletivas. Neste sentido, confessar nossas falhas a um sacerdote, representante de Jesus e da comunidade eclesial, é um exercício de humildade, uma assessoria pela busca de nossa própria natureza (divina) que está para além da esfera individual. Enfim, ser pecador não é algo que eu faça ou deixe de fazer, mas ser discípulo tem tudo a ver com o exercício de fraternidade. E a reconciliação com Deus só faz sentido no compasso da reconciliação com as pessoas.

A Confissão é, portanto, mais que uma vivência sacramental privada. É um chamado a convivência humana de qualidade, em Cristo Jesus.

Na raça e na paz Dele,

J. Braga.

Comentários

  1. Falou bem Braguinha!
    Só pra complementar, se me permite, o que diz nossa santa Igreja Catolica em seu Catecismo sobre O sacramento da Penitência e da Reconciliação



    1440. O pecado é, antes de mais, ofensa a Deus, ruptura da comunhão com Ele. Ao mesmo tempo, é um atentado contra a comunhão com a Igreja. É por isso que a conversão traz consigo, ao mesmo tempo, o perdão de Deus e a reconciliação com a Igreja, o que é expresso e realizado liturgicamente pelo sacramento da Penitência e Reconciliação (33).

    SÓ DEUS PERDOA O PECADO

    1441. Só Deus perdoa os pecados (34). Jesus, porque é Filho de Deus, diz de Si próprio: «O Filho do Homem tem na terra o poder de perdoar os pecados» (Mc 2, 10) e exerce este poder divino: «Os teus pecados são-te perdoados!» (Mc 2, 5) (35). Mais ainda: em virtude da sua autoridade divina, concede este poder aos homens para que o exerçam em seu nome.

    1442. Cristo quis que a sua Igreja fosse, toda ela, na sua oração, na sua vida e na sua actividade, sinal e instrumento do perdão e da reconciliação que Ele nos adquiriu pelo preço do seu sangue. Entretanto, confiou o exercício do poder de absolvição ao ministério apostólico. É este que está encarregado do «ministério da reconciliação» (2 Cor 5, 18). O apóstolo é enviado «em nome de Cristo» e «é o próprio Deus» que, através dele, exorta e suplica: «Deixai-vos reconciliar com Deus» (2 Cor 5, 20).

    MUÑOZ

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