Que camisa você veste? - Rogério Oliveira

Pense na seguinte cena: lá estava eu, feliz da vida com a vitória do meu time e a conquista daquele campeonato. Encontro um colega na rua e vou puxar assunto com ele. Pergunto-lhe se assistiu ao jogo final. Ele, rispidamente, com rancor nos olhos e ressentimento na fala me responde: “Você acha que eu vou perder tempo vendo esse time? Não sou vagabundo ou cachorro”. 

Não sei quem ensinou a este meu colega que toda pessoa que torce pelo meu time é vagabundo ou um cão. Pelo que me consta, meu cachorro nem torce pelo meu time. Pelo contrário, foge de qualquer manifestação de fogos de artifício. E eu não sou um animal como meu colega citou e nem um vagabundo.

Sei que você, leitor deste blog, é uma pessoa que busca ponderar as coisas. Claro que nenhum de nós está livre de cair nestas generalizações. Mas é preciso ter muito cuidado. Usei o exemplo do futebol, mas poderia usar a discussão da cor da pele, da origem étnica, da expressão religiosa, do gosto musical, da orientação sexual, do estado natal ou do poder econômico. Todas são passíveis de generalizações (todo negro é isso, todo japonês é aquilo, todo crente é assim, quem gosta de funk é aquilo, se é gay é porque é isso, só podia ser da terrinha ou isso é coisa de pobre). Todas podem gerar preconceitos doídos. Essa é uma primeira ideia. 

Voltando novamente à conversa sobre futebol, vez ou outra sempre o assunto volta. Este esporte virou negócio rentável. Os grandes clubes nacionais faturam alto em razão da paixão que as pessoas têm pelos seus times de coração. Há jogadores ganhando centenas de milhares de reais por aí. E boa parte dos torcedores vive com seus mirrados salários. Por que bancar esta estrutura toda se o torcedor não ganha nada quando o time ganha um campeonato?

Eu já havia comentado aqui que identidade é opção, escolha política. Se você tem um time de coração, você escolheu torcer para ele, seja por sua história, por sua torcida, pelos títulos conquistados, por influência de algum parente ou de amigos. E você acaba carregando consigo, as características que se atribuem àquele torcedor ou àquela agremiação. Claro que é preciso ser crítico aos caminhos que o clube está trilhando. Contudo, este é um valor que não se mede e que você gosta de ter. Esta opção ajudou a moldar sua identidade. Esta é a segunda ideia.

Meu filho, desde bebê, tem o uniforme do meu time de coração. Desde pequenino já aprendeu as canções publicáveis das nossas torcidas organizadas. Procuro sempre festejar com ele nos gols e nas vitórias conquistadas. Ele já canta o hino do clube. Independente do time, eu sei que muitos pais e mães fazem o mesmo. Tento usar meu poder de influência. Se no futuro, ele escolher torcer por outro ou para ninguém, ainda assim será meu filho. O amor é incondicional. Terceira e última ideia.

E o que tudo isso tem a ver com a pastoral? Tudo, não é? Estar na Pastoral da Juventude, considero eu, é trilhar um caminho privilegiado no seguimento de Jesus e na continuidade da semeadura do Reino de Deus. Muitos se aproximam e se encantam. E esta é uma das nossas tarefas, ajudar a encantar. Está na nossa identidade. Como “pais zelosos”, buscamos motivar as novas gerações, deixar um legado de um caminho que consideramos válido.

Fizemos opção por realizar nosso trabalho pastoral nos moldes, na linha proposta pela história da PJ. A metodologia, as opções, o discurso, o jeito de ser e de fazer nos encantaram. São partes da nossa identidade. Gostamos de ser assim. Queremos ser assim.

Claro que tem gente que não concorda ou não quer trilhar o mesmo caminho que a gente. Já disse aqui e volto a repetir. Toda discordância merece uma reflexão. Quem discorda de nós nos dá duas possibilidades: rever o caminho traçado ou reafirmá-lo. Sempre fui favorável ao diálogo. E, por definição, diálogo é um caminho de duas vias, você dá e recebe, fala e ouve. Quando se torna um monólogo, fica inviável.

Retomo ainda a primeira ideia deste texto. Por diversos cantos do país, sofremos preconceitos. PJ é isso, PJ é aquilo, faz aquilo outro, normalmente num tom negativo ou prejudicial. Nenhum de nós gosta disso. Não façamos com outros grupos religiosos, pastorais, eclesiais ou mesmo sociais a mesma coisa. Tenhamos critérios, mas não nos rotulemos. As pessoas são muito mais do que as camisas que vestem. Quem não está contra nós, está a nosso favor, disse Jesus (Mc 9,40).

Por fim, mesmo que o trabalho seja imenso e que o fruto seja pouco, vamos respirar fundo e tocar pra frente. Como um filho que você tenta inicia-lo a gostar do mesmo time que você, no fundo acaba sendo uma aposta. Apresentemos a proposta. Vistamos a camisa. Cantemos nossos cantos. Mas tenhamos clareza. Não temos total gerência ou controle sobre os rumos que os grupos que acompanhamos seguirão. Façamos a nossa parte com dedicação, afinco e amor. Amemos a juventude e a causa do Reino. Sempre. Incondicionalmente.

Fonte: Pejotando

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