As 5 Sabedorias - Uma perspectiva para a Educação - André Camargo


Escrevi recentemente sobre a diferença entre inteligência e sabedoria. Argumentei que o nosso mundo não precisa de pessoas mais inteligentes; precisa de pessoas mais sábias. Do meu ponto de vista, as escolas devem procurar superar a ênfase no desenvolvimento cognitivo, a fim de incorporar esta noção de sabedoria. Se você quiser ler, clique aqui.

Este texto de agora pode ser visto como um aprofundamento do anterior. Trata-se de um jeito de encarar a educação a partir de cinco tipos de sabedoria.


O fundamento deste método pedagógico é a imersão em uma mandala. Isso significa que não adianta aprender sobre as sabedorias, em nível discursivo: o que são, como funcionam, por que utilizá-las. O que interessa é a sabedoria vivida, posta em prática.

As sabedorias são transmitidas ao se compartilhar uma mesma visão (uma mandala) e por meio de exemplos. O grupo de alunos aprende a partir das experiências que o professor propicia, incluindo aí suas ações, seu jeito de pensar, de se relacionar e de encarar as coisas. Isso equivale ao modo como absorvemos nossa língua materna: sem precisar de sala-de-aula, quadro negro e explicações.

A formação de professores para atuarem nesta perspectiva não depende, portanto, de um acúmulo de informações a respeito das diferentes sabedorias. O professor é ele mesmo um aluno, e deverá estar engajado no processo de apropriar-se das sabedorias. O processo de conhecê-las “de dentro”, por assim dizer, não tem começo nem fim.

A Educação é um programa de transformação do olhar e da ação. Como não há começo nem fim, todos são admitidos no ponto em que estão. Também é fundamental, para esta concepção de educação, que a escola seja aberta e que os alunos sejam livres. Cada um deve poder se engajar no seu próprio ritmo, entrar e sair livremente, participar do seu jeito.

A primeira das cinco é chamada de SABEDORIA DO ESPELHO. É a capacidade de entender o outro em seu próprio mundo. Opõe-se, portanto, à atitude comum, utilitária, de enxergar o outro a partir de si mesmo. A compreensão do outro em sua própria paisagem gera acolhimento.

A segunda é a SABEDORIA DA ALEGRIA ALTRUÍSTA. Aqui, trata-se de desenvolver a capacidade de se sentir genuinamente feliz com os progressos dos outros. A capacidade de alegrar-se com as transformações positivas na vida dos outros é uma base sólida para a motivação do professor. Quanto mais pura a motivação, quanto mais ancorada sobre a alegria altruísta, menos cansativa é a sua prática.


A SABEDORIA DISCRIMINATIVA está ligada à compreensão da impermanência em tudo e em todos. A contemplação da impermanência – de que todos os fenômenos, inclusive nossos amigos, familiares e nós mesmos, nossa casa, nosso planeta e este universo, nascemos, crescemos, declinamos e cessamos – gera flexibilidade, compaixão, desapego e um senso claro de prioridades.

A SABEDORIA DA CAUSALIDADE nos permite enxergar com clareza que ações positivas geram consequências positivas, enquanto ações negativas geram consequências negativas. O que vai, volta. Chamamos de positiva a ação que gera felicidade, paz, bem-estar e de negativa a ação que produz sofrimento, perturbação, desarmonia. O ponto fundamental deste tipo de sabedoria, contudo, é aprender que é possível transformar em algo positivo o que chega a nós como negativo, como um obstáculo.

A última das cinco sabedorias é a SABEDORIA DA FLUIDEZ e está associada à capacidade criativa da mente. Supõe a compreensão de que a textura do mundo não é objetiva, científica, mas insubstancial, ‘artística’. Nossa experiência de realidade, portanto, é móvel e está sujeita às estruturas internas a partir das quais construímos e enxergamos o que está diante de nós. Modificamos o mundo ao modificarmos a nós mesmos.

O modelo pedagógico das sabedorias pressupõe um sentido forte de comunidade. A escola deve acolher não apenas os alunos e professores, mas também os familiares e o entorno. As reuniões de pais são oportunidades para focar a transformação social, a organização e o empoderamento da comunidade no sentido de criar coletivamente o mundo que queremos para nós. A escola inspirada pelas sabedorias pode ser tornar o foco desta transformação.
---
Texto adaptado da palestra “Os Cinco Dhyani Budas”, proferida em 29.11.11 pelo Lama Padma Samten, em São Paulo. Todos os méritos pelas ideias apresentadas devem ser creditados ao Lama e à linhagem que representa. Assumo a responsabilidade pelos erros, omissões e imprecisões que o texto porventura carregue, decorrentes do esforço de transmitir o que ouvi a partir de meu entendimento limitado. 

Comentários

Postagens mais visitadas